Ora, é com imenso prazer que apresento no meu blog o contributo de um artista Português. Será na certa o primeiro de alguns que se seguirão. Aliás, este tema, um pouco "quento" - confesso, é parte integrante desta nossa breve conversa.
Neste ano de relevada importância para o Miguel e os Delfins, conversamos não sobre o início do fim ou o fim do início mas sim sobre as letras, a actualidade e sobre um ponto de vista muito particular acerca da "indústria" musical em Portugal.
Aqui vamos nós:
Sobre letras:
King_leer (KL) :
Como autor de letras, tens de certeza a faculdade de criticar/compreender uma letra de uma música não da tua autoria. Ignorando essa faceta e ficando tu no papel de simples ouvinte, que música e que autor/compositor Nacional ou não, mais te marcou e porquê?
Miguel Ângelo (ML) :
Paul Weller. Para mim letras para canções não são poesia, são uma outra forma de expressão à parte. Weller sempre conseguiu equilibrar um lado mais poético com um lado mais social, muitas vezes até militante. Tal como Dylan. E sempre emocional.
Ainda nas letras:
(KL) :
É algo que eu exploro sempre. O que está por trás de um certo tema. Quem era o protagonista da "Marcha dos Desalinhados"? (Versão do colectivo Resistência pode ser vista no video-player deste blog).
Explicas-nos o que "esconde" este tema? Já contabilizaste as baixas ou elas continuam a aumentar?
(MA) :
Baixas, todos os dias, em sacrifício do avanço no terreno... Qualquer coisa que se escreva é como qualquer coisa que se diga, muitas vezes autobiográfica outras somos nós noutra pele, a experimentar comunicar, chegar a alguém, na certeza porém que temos de chegar do fundo de nós próprios.
Quando se escolhe um meio de vida em que recorrentemente se parte de um silêncio e de uma folha em branco, parece-me evidente que é preciso estar do outro lado do mundo, vislumbrando ao longe alguns moínhos de vento, que na verdade são imaginários mas estão lá, a empurrar-nos para o lado.
Essa letra, como muitas outras que escrevi, fala da busca da independência do ser. De grande independência.
Na actual Crise Global:
(KL) :
Por palavras tuas, o que pensas desta crise, quais as suas origens ? O que deve ser feito para a ultrapassar?
Estamos perante um modelo esgotado? Não teremos várias crises ao mesmo tempo (económica, social, de valores, de figuras carismáticas)? Fugindo à música, dá-nos a tua visão.
(MA) :
Crisis, What Crisis? A crise é só para alguns, é certo, e mesmo dentro do grupo dos mais desfavorecidos, neste momento a crise será só para aqueles que não consigam manter o emprego ou não estejam profundamente ligados ao sector dos serviços.
Há um projecto "utópico", entre aspas porque não o considero tão utópico assim, que nos fala de uma sociedade sem moeda. Chama-se The Venus Project e merece ser consultado, nem que seja só para fazermos um exercicio de pensamento sobre a sociedade em que vivemos e os possíveis cenários alternativos. Estamos muito presos a esta noção de que só o neo-liberalismo, ou, por oposição, a ditadura de Estado, são os sistemas finais de organização social. Já se viu que resultam muito falíveis, que mesmo o homem mais rico, poderoso e qualificado é sempre um menino ladrão...
Por Último:
(KL) :
Com esta pergunta, posso não me ajudar a mim próprio mas, este blog tenta ser diferente, por isso lá vai:
Se reparares, os meus "posts" tem muita informação relativa a artistas estrangeiros. Na minha passagem pelo Porto Canal, no programa "Porto Alive", penso ter sido o primeiro a divulgar os nossos "A Jigsaw", os "Dapunksportif" e várias vezes passado/divulgado "A Naifa" - um projecto que gosto bastante - entre outros.
Claramente, falava mais de artistas estrangeiros – porque os há mais. Agora, eu noto – e é aqui que queria a tua opinião – que existe mais dificuldade em contactar artistas Nacionais do que Internacionais. Tirando alguns casos, ou não se obtém resposta (como um grupo em alta que recentemente saiu no NME e eu enviei cópia do artigo ao manager e banda e nem uma palavra de retorno) ou colocam-se entraves nesse mesmo contacto. Acho que é um fenómeno que até transcende a música. Gostava de saber a tua visão sobre este meu "drama"!
(MA) :
Bem, sobre isso o problema é que por cá a organização à volta dos artistas é menos competente e profissional do que noutros países, derivante do mercado dimunuto em que vivemos e onde operamos. Muitas das pessoas - incluindo músicos - não são profissionais a tempo inteiro. É um drama e acredito que só em raras excepções o facto de não se conseguir chegar à fala com eles seja fruto de algum sobranceirismo. Se vires bem, mesmo muitos dos nossos maiores artistas acabam por gerir uma série de coisas sozinhos: videos, capas de discos, espectáculos, cenários... etc. Muitas vezes não porque não se arranje alguém para o fazer, mas porque essa é a única maneira de as coisas sairem realmente como as idealizaram. Não há muitos profissionais dos vários sectores «formados» para esta arte pop! E o tempo é cada vez mais curto... O dia acaba todas as noites!
De qualquer modo, com ferramentas como esta com que estamos a «falar», no advento da net com MySpaces e Facebooks, ficamos todos muito mais próximos.
E sim, se se conseguir, falar directamente com os artistas é sempre mais fácil do que passar pelo filtro da editora ou do management. Se bem que em alturas de muito «tráfego» seja preciso alguém para dar vazão...
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